domingo, 13 de dezembro de 2015

Santuário

A morte do cordeiro
Agulha no palheiro
Tudo aquilo que fui
tudo aquilo que jamais serei.

Transpassado pela lança
Funeral da esperança
Tudo o que tive
e nunca mais terei.

O que te tornaste?

O sangue que se derrama
Acalenta a criança.
Não traz vida àquele
que já foi quebrado.

No amor, um santuário
Invadido, queimado, estuprado
Traído por aquilo
a que um dia me uni.

O que me tornei?

Voe alto, incendiado, libertado.
Alcance a estrela, enterra-me com tua pólvora.
Eu não posso chorar, pois segui os meus passos.
Eu não posso vencer, pois não há mais nada a perder.

Acorrentado, flagelado, mutilado.
Criança solitária, abrace o seu arco.
Atire ao léu, caia com seu malfeitor.
Atire ao léu, traga a morte àquele que te matou.

[Fernando M. Minighiti][13.12.15][16:44]




quinta-feira, 26 de novembro de 2015

The sold one

I was born into the wild
and crazy, lying eyes.
Talking about your life to me
And I don't know how do I should be.
There's too much between lines
I read what you left to me
But i'm not like those dumb kids
Much more that you can see

I am evil
Older
Cheaper.
I am lonely
And I am grieving
But I'm cheap.

This isn't real
but i swear I could feel
As long it's a game
I dare to play
Is not to be
even if i fall on my knees
Could I be a looser
if you be a scoffer?

All of them talk 'bout beauty and charm
You're not so different.
but your glamour makes you something plus
lubricous, like a dangerous serpent.

I could kid myself and think that is true love.
I could kid myself and think that I am the only one.
I could kid myself and think that I am the salesman
But I'm the fuckin of sold one.

The sold one, not the salesman
Take my futures
And buy my minutes
Take my futures
and buy someone

Evil
Older
Cheaper.
someone lonely
someone grieving
But cheap.

This isn't real
but i swear I could feel
As long it's a game
I dare to play
Is not to be
even if i fall on my knees
Could I be a looser
if you be a scoffer?

[Fernando M. Minighiti][02:18][26.11.15]




sábado, 14 de novembro de 2015

Azul

P.T.C.

Voa, passarinho
nasceste para o azul,
e ao azul deves pertencer
limitado pelo ilimitável
finito, mas não sem provar do infinito.

Voa, pássaro silvestre
deixaste pai, deixaste mãe, deixaste o ninho
abraçaste o mundo com teu inegável carinho
com a sede voraz de mais... liberdade
livre arbítrio.

Voa, ave do mundo
pois ele te pertence - e tu, a ele -
como tuas penas douradas
que sempre te guiam de volta
para debaixo da asa de onde saíste

Mas voaste, passarinho.
fizeste do 16º o teu ninho
trocaste a montanha pelos blocos cozidos
mas ora, também de barro
não é feito o tijolo?

Voa, pássaro sertanejo
ganha o mundo inteiro
derrama-te em palavras alheias
que se assentam
com o bater de tuas asas.

Voa, pássaro livre.
Fortalece a mente, fortalece o corpo, fortalece o espírito,
Já encontraste a feliz cidade, há anos, a felicidade.
mas lembra de minhas palavras humildes?
Teu limite é o infinito

E se um dia cansares
se voar não quiseres mais
lembres que nasceste um pássaro livre
que ao azul pertences
e ao azul sempre há de retornar.

[Fernando M. Minighiti][11/11/15][02:45]











quinta-feira, 29 de outubro de 2015

Abstração

Com o tempo e com a idade, ele aprendeu a abstrair. Se foi ele, se foi o mundo, ninguém soube dizer. Muito menos ele mesmo. O fato é que tudo o que era pesado tornou-se leve e a ausência de gravidade o fez flutuar. As métricas tornaram-se minimalistas. O exagero regressou ao estado natural daquilo que era apenas essencial. Tudo passou a ter o sentido que nasceu para ter. Até a abstinência.
Primeiro, ele precisou secar. Nadara em águas profundas, porque sempre fora um enigma. Na imensidão do revolto mar da psique, encontrara seu lugar na submersão total. Regressar à superfície fora difícil e trabalhoso. Pesado, no sentido prático. Quando aquele que se entrega aos seus instintos animalescos escala a montanha do consciente, sofre. E ele sofreu. E foi o primeiro conceito que ele abstraiu. E aprendeu. So. Fri. Men. To. Enquanto estava submerso, estava entregue. Não ao mundo, mas a si. Fora na genuinidade dos sentimentos irrefreáveis que descobrira seu eu mais profundo, tanto quanto aqueles bancos de areias submersos. Como emergir ao pico mais alto, e levar consigo tudo aquilo que descobrira ser? Ele o fez. E o vento o secou.
Depois, ele esqueceu. Aos poucos, como quem não quer que o doce acabe. Vagarosamente, assim como o outono despe as árvores. E, lá do alto, suas memórias caíram como folhas secas. 
Se as palavras eram o tronco, as flores eram personificação da voz. A primeira coisa que o deixou foram as cordas vocais. Já não se lembrava mais da tonalidade, da voz, do timbre, do canto. O vento sussurrava em seus ouvidos, então até isso fora despejado para fora de si. 
Depois, foi a vez da amargura. Da decepção. Da mágoa. Da tristeza. Abriu os olhos, mas não viu a imensidão que o cercava, mas tudo aquilo que o continha - e nem por isso menos imenso. Viu o coração pulsante e os rios de sangue. As colinas de ossos. Os pulmões negros. Viu as borboletas secas e mortas em seu estômago. Nenhuma delas agonizava. Nenhuma sofria de uma morte dolorosa e ainda inacabada. Nenhuminha. Submergiu todos os cadáveres com bile. E o a dor nunca mais o tocou. Nem a elas.
Quando enfim despiu-se, quando o outono finalmente fizera seu trabalho, tranquilizou-se. Percebeu que existia. Isto é, deu-se conta dos processos. Precisou estar à beira da mais alta escarpa, precisou despir-se, precisou corroer-se com seu próprio ácido para que, agora, olhasse suas necessidades. Sua biologia.
Lá estava ele, emerso, um saco de pele que guardava ossos e sangue. Cada batida de seu coração era como um soco no peito, e ele podia sentir cada glóbulo fluir em suas artérias mais profundas. O ar que seus pulmões roubavam parecia limpo demais para ele, que precisou de tempo para acostumar-se a sentir seu par de órgãos, antes secos, inflando e murchando. Inflando e murchando. Inflando, inflando e murchando. E, quando fechava os olhos e se concentrava, podia jurar que sentia cada neurônio em seu cérebro, em sua rede de bilhões de elos. Ele era um deles.
E assim viveu e viveu. 
Viveu. Sóbrio. 
Sóbrio, viveu. 
Sobreviveu.
E, quando descobriu que sobrevivia, abriu os olhos. 
Ele era o mesmo - ossos, pele, órgãos, carne, sangue. Alguma coisa faltava, e essa coisa era inominável. Aquela querência o tomou de tal forma que precipitou-se. Em espírito e em corpo. E, como uma última pétala, atirou-se para o fundo do seu ser e para o fundo do mar de onde saíra. 
O vento do inverno que  já chegava balançava sua queda, assim como a árvore balançava furiosamente. Mas se ela estava nua, de onde vinha aquele sussurro que só existe quando o vento acaricia as folhas, as flores? Onde estaria escondida a vida naqueles galhos secos e mortos? 
Onde o ciclo deveria renovar-se?
Abriu os olhos. Cada vez mais perto de sua existência, via inúmeras estrelas refletidas na superfície do mar. Podia ouvir o batuque selvagem que se escondia tão bem naquelas águas negras, perfuradas por luzes que não eram delas.
Daquela vez, as notas eram diferentes. 
Guinou seu corpo, leve como uma folha. Sentia o sangue fluir e pulsar em suas têmporas, enquanto o rugido de um leão ecoava pela garganta. 
Inclinou-se para a imensidão. O céu estava estrelado.

[Fernando M. Minighiti][28.10.2015][04:30]




segunda-feira, 5 de outubro de 2015

O vôo

Voe para longe,
Passarinho errante.
E não lembres a nenhum instante
Porque o politicamente correto
Nunca lhe foi algo concreto.

Voe para a noite,  distante
Não ofegante, esconda-te nos Andes.
Mas não,  não te adiantes.
Voe para a lua e, se não quiseres voltar
Trate de esconder bem teu coração noutro lugar. 

[Fernando Martins Minighiti] [05.10.15][7:25]



domingo, 6 de setembro de 2015

Poema de despedida

Do que é feita a partida?
Quais são seus ingredientes?
O remorso que, de tão íntimo, torna-se sanguíneo?
A inveja latente?

Mas, amigo meu, inveja do que?
Inveja da ida, da despedida?
Dos restos mortais, do que volta ao pó?
Inveja... de se sentir traída?

Ah, a despedida, nossa infiel amiga!
A abraçamos com falsa aceitação,
E em seu aconchego, mesmo em sua companhia,
definimos, catalogamos "solidão".

Mas quando partires, amigo, que vivas!
E se a dor for deveras latente,
Erga-te a cabeça e relembre:
"Só tem vida aquele que olha pra frente".

[Fernando M. Minighiti][00:01][06.09.2015]


quinta-feira, 20 de agosto de 2015

Início

Toda alegria começa com uma certa tristeza. Ao menos comigo sempre foi assim. Como construir uma mansão, uma casa que seja, sem calejar as mãos com os tijolos? Toda alegria começa com uma certa tristeza. E toda tristeza é partilhada na incerteza.
Não sou um menino. Não sou homem e nem ser humano. A profissão me é uma distração. A música do mar acalma suas próprias tormentas. Chamo-me de poeta, de escritor, mesmo sabendo  que não o sou. Mas é o mais próximo que posso chegar de uma consciência humana. Esse corpo é só uma metaforização de palavras condensadas e nada mais. Comprimidas, esmagadas, pressionadas, desenham as mãos, os pés, os olhos, as pernas, o tronco. Osso e sangue não me completam - às vezes a matéria de que sou feito escorre ou me escapa em fúria. Logo me encho novamente. Não, não me encho. Recomponho-me. A aparência é essencial. Porque toda alegria começa com uma certa tristeza.

[Fernando M. Minighiti][20/08/2015][02:57]



quarta-feira, 19 de agosto de 2015

Terça feira

Uma terça é uma terça, e sempre será. Primeira de três apenas no nome, pois não é o início, não é o meio e muito menos o fim. O copo de leite pela manhã não é nem meio cheio, nem meio vazio. A manteiga passada no pão não é suficiente para fazer uma torrada, nem para enojar-se com o creme amarelo. Tudo tem aquele tom de "quase lá", mas nunca lá, muito menos aqui. O que teve início ontem começa a evaporar, mas ainda não é nuvem e nem chuva.
A terça te abraça com aquela inércia intrigante quando o despertador toca - nem alto, nem baixo. Talvez depois de três sonecas a densidade desse dia te nocauteie com seus inúmeros questionamentos. O que? Porque? Quando? Como?
Essa terça roubou todo meu desatino e não sei como vencer algo que é e não é. Talvez todas as terças sejam ladras de alguma coisa, para que possamos conhecer a não existência, para que saibamos como é estar em lugar nenhum, em nenhum momento.
As terças são vazios tangíveis. 
Ou talvez seja eu que não tenha olhado meu copo enquanto o enchia de leite, e agora não saiba se ele está meio cheio ou meio vazio. Ou então o café que me serviram depois do almoço não estava suficientemente quente. 
O tudo e o nada me completam nesse mês chamado terça feira.


[Fernando M. Minighiti][19.08.2015][01:05]




segunda-feira, 29 de junho de 2015

Estações

No outono, ele se atrasou três horas para voltar para a casa. Deliberadamente. Isso porque aquele outono pareceu uma primavera.  Sentou na mesa daquele bar tão inesperadamente como as azaléias desabrocham sem aviso prévio. Dividiu 4l e 200ml e dançou seus erros como se fosse a Valsa das Flores.  E aquele muro,  de repente, não era um muro,  mas os portões do paraíso,  e sua língua, a escada para a salvação. Pagou sua conta com direito justo, que acabou tão rápido como o outono deve acabar.
No inverno,  ele não queria mais se atrasar para voltar para casa,  porque ele não queria voltar para casa.  E as vezes não voltava.  Só às vezes. E aquele inverno foi intenso, como todos os invernos, mas foi quente.  Quente porque o corpo humano é quente, e os olhos eram fogo vivo.  Quente por que a coberta era felpuda,  o colchão era felpudo,  o tapete era felpudo, o sofá era felpudo. E até o coração era felpudo, mas isso passou despercebido.  E o álcool já não era tão frequente.  Os 4l e 200ml eram metabolizados, e a Valsa das Flores ainda tocava. E o muro, que era o portão do paraíso, tornou se ícone,  e as línguas,  que eram as suas escadarias, já não se cansavam na subida.  O sol nasceu naquele inverno,  mas o calor do corpo não o fez sentir, como deve ser feito nos invernos.
Na primavera, ele não voltava mais para casa.  Deixou-se vagar em noites aleatórias em casas subsequentes.  E o que era um virou dois.  O que era dois, virou quatro.  Tudo assim, tudo ao quadrado.  E o expoente aumentava. E aquela primavera foi precoce,  como não deveria ser.  E foi fria.  Fria porque o frio do inverno, que não se fez presente, reclamou seu trono.  E a coberta  felpuda rasgou,  o colchão felpudo murchou,  o tapete felpudo gastou, o sofá felpudo sujou.  Os 4l e 200ml tornaram-se 8l e 400ml, 12l 600ml, mas não eram divididos. Pagava suas contas com dinheiro emprestado.  O muro,  que foi os portões do paraíso e um ícone,  manchou-se de sangue,  e as línguas que eram suas escadarias e que já não se cansavam da subida,  volveram-se para baixo,  rumo ao mais gelado círculo do inferno.  O círculo dos perdidos.  E aquela primavera foi longa,  como só os invernos sabem ser.
No verão,  ele finalmente voltou para casa.  A bebida se fazia item obrigatório, então quem se importava com o expoente elevado dos litros ou das mls? Pagava sua conta com dinheiro roubado, olhava seus familiares como estranhos, e dançava seus erros com a convicção de uma marcha fúnebre.  Se o frio diminuiu,  a dormência dos ventos primaveris o privou das sensações.  E olhava para aquele muro,  que havia sido os portões do paraíso, um ícone e os portões para o inferno, como a lúgubre fachada de um cemitério.  E a sua língua,  que havia sido a escadarias,  para cima e para baixo,  tornou se o caminho tortuoso até os túmulos.  Naquele verão, o sol não raiou,  e seu horizonte era seu teto.  E ele já não sabia mais quanto tempo aquele verão duraria, pois estava sendo longo, como nenhum verão deveria ser.
No outono subsequente, ele saiu de casa e sentiu-se como se tivesse passado a vida inteira fora.  Mas a calmaria era tamanha que a azaleia não desabrochou,  nem mesmo sem aviso prévio.  Engoliu seu vício sem sentir o gosto,  e não se importou se pagou a conta com dinheiro justo, emprestado ou roubado.  Sequer se importou se pagou ou não.  Sentia o tapete felpudo,  o colchão felpudo,  a coberta felpuda,  o sofá felpudo em seu coração igualmente felpudo e, por isso mesmo, adormecido gratamente.  Docilmente.  Caminhou por aquele bar uma vez inesperado, e deparou-se com o cemitério que já havia sido céu.  Caminhou por sua língua que não o levava para cima ou para baixo, apenas adiante.  Acendeu seu tabaco,  talhou seu corpo,  e cobriu sua pele de desenhos infantis feitos com seu próprio sangue,  por que era o mesmo sangue da infância,  aquela que ele sentia falta,  e aquilo foi bom.  Não soube dizer quanto tempo passara fora,  ou quantas estações mais aquele outono apático duraria.  E não fazia questão.  Daquele vez,  ele jamais voltaria à sua casa, ou a de alma viva que fosse.

                                                                                        [Fernando M. Minighiti][18.06.2015][22:30]


sábado, 27 de junho de 2015

Sumário de culpa

Senhoras e senhores membros do júri. O juiz que vos fala inocenta os presentes réus de todas as acusações, os isenta de quaisquer sentenças e declara-se ele mesmo culpado por todos os crimes aqui citados, e por todos que ainda ocorrerão, minuciosamente abaixo citado:
Pela podridão etílica na bile já ácida, declaro-me culpado pela supervalorização do vinho e a ausência do pão (alego que nunca fui tão cristão). Não há nada pior do que uma alma faminta, e que isso recaia sobre mim também. Nos bolsos. Eles têm espaço de sobra. 
Pela língua pegajosa, podre, fétida; pelos dentes ásperos; culpado pela ausência do creme dental. E se são menos beijos, ou se até mesmo eles já não são o que eram, é fruto de meus delitos, também. 
Culpado por pintar um sol majestoso em uma trégua de uma semana na frente fria. Culpado pela tolice de acreditar que ele seria sustentado em um firmamento invisível e seria forte, duradouro.
Declaro-me culpado por dizer palavras impróprias nos momentos impróprios. E mais do que isso. Confesso o delito de cerrar meus lábios enquanto penso nessas palavras impróprias, mesmo que não as verbalize, pois elas sempre estarão lá, na minha cabeça, e não tenho planos de me arrepender e tirá-las de lá. 
Imputo-me como pior tipo de réu, aquele que não demonstra arrependimento. Pois não me arrependo. Uma semana de delitos, por vezes, valem uma vida, e esta é a única vida sem culpa que posso viver. 
Senhoras e senhores membros do júri. Que seja dada a sentença a esse juiz-réu, preso, torturado e condenado pelo crime de ser sonhador. 

[Fernando M. Minighiti][27.06.2015][16:03]


quarta-feira, 17 de junho de 2015

Peace

Colorful flowers.
Pale moon on sky.
Warm sand at night.
This path of mine.
Those shining stars,
Eternal mine.
Only god knows how
I wish you
by my side.
But the way is short,
There is no place.
I'm the lonely one,
but never alone.

I never knew
I would be looking
in myself
All the things that I know
I need to be.
Cause when I cried,
it was to clear my view
And now I face all the things
I couldn't see.
And this is peace.

And all my tears,
they were the fuel
to make grow
the tree on the road.
And it takes me high,
out of my place.
Up there, I see
clearly,
the sun is rising.
And it is so sweet.
It is so bright.
Is not divine, but
I know, it's mine.

I never knew
I would be looking
in myself
All the things that I know
I need to be.
Cause when I cried,
it was to clear my view
And now I face all the things
I couldn't see.
And this is peace.

I'm wondering
If this is for eternity.
If is not to be,
I'll keep warm inside of me.
'Cause no one can keep me
away from the seeds of my tears.

And I can see
the sun rising over me.
I can feel
the heat deep inside of me.
And if they ask me
How I came get over here
I'll say: "my tears
paved my way into this.

Into peace"

[Fernando M. Minighiti][16.06.2015][15:46]





sexta-feira, 5 de junho de 2015

Deus

Deus, perdoe-me, mas não sei o que me tornei. O único esconderijo que posso encontrar é a minha própria pessoa, e é dela que preciso me esconder. Assim, está cada vez mais apertado, e as alterativas são mínimas. Eu não sei o que acontece nos últimos dias, mas o sol nascente não chama mais minha atenção. Assim como quando ele morre no céu. As noites em claro significavam a vista estonteante do astro que nascia. Agora, ele o faz e eu nem me dou conta. Apago meus sentido e, quando os recobro com muito curto, o sol já prepara seu suicídio. O pior de tudo? Não sinto sua falta.
Deus, perdoe-me, mas, às vezes, não suporto nem a minha própria escrita., essa minha única fiel companheira. Aos poucos a abandonei, e agora perco a mão. Não sei há quantas horas estou encarando esse maldito computador, evitando o momento em que devo teclar para escoar algumas coisas que deveriam ter sido escoadas há meses. Eu não me permito nem mesmo ler. O que teria sido de mim sem meus livros, sem as palavras? Já disse o músico, serei sempre eu, as palavras, e o resto é nada mais. Mas e se o que eu me tornei exclui as palavras? O que serie? Tende piedade Senhor.
Deus, perdoe-me, mas meu corpo não é meu santuário - é minha cova. Não é minha casa, é a sarjeta onde o mendigo imundo cochila debaixo da chuva. E esse mendigo sou eu. Mendigo de pedras e lixo. Mendigo das células que me deixara. Falando nisso, você tem algumas células sobrando, Senhor?
Deus, perdoe-me, mas eu perdi toda a esperança, e encaro isso com uma naturalidade que chega a doer. Mas só por uns instantes. Depois eu vivo como se sempre tivesse sido assim. Mas eu sei, não! Não. Eu olho o ser humano aglomerado nas ruas, e o único fator que os reúne sob uma única cúpula, além do levantar e abaixar das cabeças em movimento, é a hipocrisia. É como se, na dose homeopática, eu fosse o veneno - não posso me dissolver em tamanha multidão: me estico, me dissolvo, por que minha existência é inútil em meio a tamanho dinamismo. 
Deus, perdoe-me, mas eu sou um desacreditado. Eu vejo as estações passarem, ano após ano, e não consigo fluir no ritmo do fluxo. Acumulo as folhas do outono, o bronze do verão, a cor da primavera. Mas são meus membros gangrenados do inverno que me dominam. E eu não passo de uma estátua. As eras avançam, e eu sigo imutável, impassível.  
Deus, perdoe-me, mas as asas que me deste caíram sob a tentação de Midas, e hoje são pesadas placas de ouro que comprimem minhas costas. Ganhei chifres suntuosos em minha testa, e uma marca profunda na minhas mãos. Não me odeie, Deus. Eu ainda tenho minhas asas, veja. Elas não voam mais, mas são lindas, não são? E, se você se acostumar nem vai reparar nos meus chifres. Não há espaço para auréolas. Toda bondade tem seu preço. Toda bondade corta profundo. 
Perdoe-me, Deus, mas você não existe, e essas palavras foram tão inúteis quanto os sentimentos que carregam. Quanto acreditar que há salvação.

[Fernando M. Minighiti][05.06.2015][06:03]



sexta-feira, 22 de maio de 2015

Absorção (ou Convergência)

Ela percebeu que estava do lado de fora quando acordou e viu o mundo distorcido, como que pela superfície de um lago levemente agitado. O desespero a tomou conta, e não era pela vista ruim, não. Era pela exposição, pela sua vulnerabilidade. Sentia-se nua, desprotegia.
Via borrões, mas percebeu que eles a encaravam de volta, pela primeira vez em sua insignificante existência.A viam com nitidez. Sentia as golfadas de ar frio e cortante enquanto caminhava  pela calçada, como se nada fosse mais cruel. Sua pele, desacostumada, ameaçava a rachar à intempérie.
E, ao mesmo tempo em que o vento fustigava os cabelos há muito estáticos, era difícil respirar. Tudo era rarefeito, quase como no cume mais alto, no oceano mais profundo. Ou como um peixe fora desse oceano. Pois foi assim que se sentiu quando todos aqueles olhos aquáticos e cruéis a fitaram –  debatia-se ao som de risadas que demoravam mais tempo para viajar pelo ar até seus ouvidos meio surdos, do que no ar livre.
Mas aquilo era o ar livre, não era?         
A voz falhava-lhe para deixar a garganta e, quando o fazia, soava distorcida e estranha. Cada vez que esfregava os olhos a fim de clarear a visão, mais aquosa ela se tornava. Respirava com dificuldade, pois seus pulmões eram a única coisa que parecia seca naquele mundo subitamente aquático: estavam em chamas. Arf. Arf. Fogo. Arf. Arf. Inspirar. Expirar. 
Com. Bus. Tão.
Ao poucos, caminhar tornou-se difícil. Suas pernas fraquejavam, e uma estranha característica pegajosa tomou conta de todo seu corpo, ao passo que ao retornar para seu casulo, teve que jogar-se inteiramente contra a porta para força-la a fechar – trancar era impossível: a chave deslizava e escorregava por entre seus dedos.
Ela derretia, literal ou figurativamente, interna ou externamente, para ela ou para o mundo, ela não sabia. Mas que esta versão nua e crua a matava, ela nunca teve dúvidas.
Desabou sobre o chão pautado quando perdeu completamente as forças, e deixou que a celulose sugasse o seu corpo que se liquefazia. Não obstante, a pouca matéria ainda lúcida que restava em seu castelo sugou avidamente a tinta antes escrita naquelas folhas. Sugou até a última gota, como um vampiro que acabara de acordar; como um bebê suga o peito da mãe depois de uma longa noite de sono. Sugou daquela tinta como um drogado precisa dos seus fluídos, na esperança mútua de desaparecer: ela, as palavras e o fluído.
Escuridão.
Ao recobrar a frágil consciência, estava côncava novamente. Sua pele estava sólida mais uma vez, e ela já podia levantar com firmeza. Abriu a porta e deparou-se com a floresta. Era um suave crepúsculo, mas ela sabia que aquilo era tudo, e nada no mundo tiraria aquele tom laranja escuro do céu. 
Olhou ao redor. Podia sentir o peso da pétala que se desprendia da rosa há dez quilômetros e pousava no chão, suavemente, e sentia que ela poderia ser a próxima. Mas o mundo estava novamente sob foco, e sua respiração estava regular. 
Nunca se sentira tão bem. 

[Fernando M. Minighiti][17-22.05.2015]




quarta-feira, 6 de maio de 2015

O dia depois de amanhã

Quando o céu desabou
Sua estrela jamais brilhou
E o ar pesado
Ombros cansados
Ninguém esperou. 

Quando o sol apagou
Quando o oceano evaporou
E nuvens cadentes
Tocaram o chão
Ninguém esperou. 

Pois quem saberá o que esperar
No dia depois de amanhã
E adiante?
Fecho os olhos,  sem oração
Perdido no dia de amanhã
E adiante. 

E agora,  a vida acaba dia a dia
Em meio à celestial neblina
Correntes no coração
Minha libertação. 

Quando o profano se coroa
Esperança se torna louca
No velório da bondade
O caminho para a liberdade. 

E o que será de nos dois
No dia depois de amanhã
E adiante?
Como areia, escoa em meus dedos
O que foi o ontem, e tudo o que seria amanhã
E adiante. 

[Fernando M. Minighiti] [06.05.2015][04:33]

sexta-feira, 1 de maio de 2015

La luna. El ciudad. Yo.

A noite está fria, então jogo qualquer agasalho sobre mim e desço dois lances de escada. Só quando chego no térreo, percebo que estou sem meu fiel isqueiro. Acendo meu cigarro no fogão mesmo, e corro para fora de casa antes que a nicotina se instale na sala e na cozinha. 
Caminho. O corredor é ao ar livre, e a vegetação à minha esquerda ajuda no clima noturno gelado. E isso é bom.
Paro na sacada. Coloco um gole de café na boca e tento engolir. Cuspo. Ele está recém-feito, e quase queimo até minha alma nesse simples gole. Irônico.
A noite está silenciosa. Um grupo de meninas bem unidas passa pela rua. Minutos depois, um rapaz repete o percurso, escutando música em seus fones de ouvido, sendo incapaz de cantarolar em um volume considerável. Depois ele, não há mais alma viva. Olho adiante. Minha visão dá para as casas do município vizinho, ao horizonte. As casas iluminadas pelas luzes laranjas por postes são evidenciadas, por vez ou outra, por faróis de carros que vagam perdidos e esquecidos pelas ruas. Além dessas casas, posso ver o município vizinho ao meu município vizinho. A visão de São Paulo resume-se à um monte de árvores, bem ao fim da minha linda de visão. Lá é a terra onde tudo muda.
Sei que, além daquelas árvores que criam o pacato Parque das Fontes do Ipiranga, há um cidade caótica que não dá a mínima para o fato de não existir nem uma mosca sequer aqui onde vivo. Há mais que uma cidade, há um organismo vivo, uma veia saltitante. Há avenidas, ruas, vielas, becos, bares, em uma constante e profusa explosão de diversidade. 
Eu sei que, nessa efervescência, pessoas (talvez assim como eu) estão esquecendo o dia de amanhã. Elas entram em clubs e baladas, pagando ou sendo bancados por amigos fieis. Eu sei que garotas aproveitam porque geralmente tão  free até umas 00h, 1h30. E eles bebem. Eles riem. Eles dançam, Bailan el ritmo latino y caliente. Eles beijam. eles encontram a felicidade, mesmo que por horas. Eles, esses jovens, podem finalmente vierem seu próprio eu, sem restrições por trabalhos, faculdades, escolas, vida pública. É quase que uma vida à parte. E eles se rendem ao instinto mais puro, mais carnal, mais límpido. Eles se beijam. Elas se beijam. Ele e ela se beijam. Ele, ela e ele se beijam. 
O amanhã? 
O que é o amanhã?
De olhos fechados, posso até escutar tal algazarra. Mas ela não me pertence. Eles estão lá e, eu, aqui. Há casas, árvores e uma pequena selva de pedra separando-nos. Não é meu. Não é para mim. Não pertence ao meu eu e, por isso mesmo, a tal algazarra me mata lentamente. 
Abro os olhos. Não quero mais escutar tais vozes, então não as escuto. Olho o céu. Está timidamente estrelado atrás de mim. Porém, uma lua fenomenal se apresenta à minha frente. Bela. Soberba. Cheia. Tola como os amantes. Tão mística que uma áurea quase que multicoloria a permeia, e isso me embarga sem motivo. 
Admiro sua solidão. Não há estrelas ao seu redor. A própria lua, em si, prova sua fraqueza: ela precisa do Sol. É-lhe uma necessidade. Sem ele, ela jamais seria ela, adorada, venerada. Endeusificada. Sem o Sol, a Lua não existiria. 
Então de quem seria o mérito de seu brilho, de seu esplendor? Quem era o merecedor de tal espetáculo natural?
Independente de saber ou não a resposta, independente de ser ou não digna de crédito de tal beleza, chego à conclusão que ela sempre será sozinha. Sempre. Conforme a roda dos séculos gira, o Sol lhe dá sua mão, sua luz, e ela passa a existir em meio ao nada, iluminando a escuridão, e iluminando a minha escuridão - sozinha, sem pedir nada em troca.
Olho mais fixamente para ela, e sou capaz de ver-me refletido em sua solitude. Não suporto mais sustentar o olhar, e volto a mirar as árvores que protegem-me do mundo real, a dois municípios à distância. Quase sou capaz de escutar a algazarra e a felicidade que emanava por além das árvores, mas dessa vez faço meu melhor para bloquear o som que  já chegava aos meus ouvidos.
Fecho meus olhos. Deixo meus vermes me vencerem. Então, e só então, permito-me chorar.

[Fernando M. Minighiti][01.05.2015][2:11]


sábado, 25 de abril de 2015

Minimalismo

Ser feliz é ser so
                            zi
                                 nho.
e não precisar de 
ninguém.
Ser seu próprio amigo e amente
e, por que não, i
                     ni
                mi
         go?

Eu não preciso de 
ninguém
e minha existência finda 
                                        em
                                                mim.
Ao acreditar no divino ou profano
abraçamos o sofrimento sem
                                                   F
                                           I
                                 M
                          ...

[Fernando M. Minighiti][25.04.2015][1:35]




terça-feira, 7 de abril de 2015

Loucuras

Eu vivo no fio da navalha que faz a minha barba
que arranca pelo por pelo e corta poro por poro
que desliza e faz chorar o sangue rubro e imundo
como uma chaga que explode em pus rubro e fedorento.

Sou nebuloso como o amanhecer sem sol,
como a fumaça do meu cigarro
e o jovem câncer que se forma no meu pulmão direito
por que eu não sou direito e não preciso dele - do câncer ou do pulmão.

Me agarro ao passado como uma sanguessuga medieval
e agora solto e vejo que meus dentes estão podres tamanha a formça
e mesmo que ele se vá, a marca sempre estará aqui na gengiva
como a de um idoso desdentado, cansado

Cansado de lutar, guerrear e errar
Lutar guerrear e falhar
lutar guerrear e perder os dentes, a compostura, a razão, a alegria
Alguém hasteie a bandeira branca e encardida dessa paz de mentira!

Porque ela não existe, é uma ilusão
e é isso que eu sou, uma projeção
de um conceito inexistente que brilha sobre cicatrizes
e jogos de versos que disfarçam meu sorriso desdentado.

Eu sou dos leitores o mais mesquinho
aquele que se esconde em palavras e poemas errados como os que vos narro
sem rima sem métrica e sem beleza
e ai se não gostar, eu faço o diabo a quatro.

Grito, esperneio, choro, escondo, mascaro
por que meu demônio é o demônio meu
e eu já não sei dissociar esse lado errado
que já se tornou o lado certo, mas que ainda chora por ser um diabo

Eu enfeito meu rosto, me escondo, me amarro
eu chamo atenção e não ouve não ver, não dar um abraço
daqueles apertados só para ter a merca dos braços marcados em sangue
nas minhas costas suadas e velhas.

O que foi? O suor te incomoda?
Não vou trocar de roupa, por que é por dentro que estou impuro
Eu sou um canalha que nasceu e morreu e nasceu até a lágrima secar
até que não conseguisse mais suportar e esconder, e guardar e gritar:

"Me livrem do que eu sou!
arranquem-me de mim e me criem do zero,
me moldem e me cortem e me rasurem
me desenhem, apaguem, rabisquem, corrijam,
me coloquem no começo como uma folha em branco

até que eu seja a ventania que segue adiante."
Porque é isso que eu sou
um pouco de alegria e um pouco de espanto
um andarilho errante que viaja os sete cantos em busca de um nascer de sol menos nebuloso.

[Fernando M. Minighiti][07.04.2015][00:26]



quinta-feira, 26 de março de 2015

Sobre 25 de março

Eu nunca usei o presente blog como um canal com o qual eu me comunicasse com outras pessoas - apesar de receber modestas visitas. Onde quero chegar é que sou um egoísta. Nunca preocupei-me em escrever em primeira pessoa, nunca procurei interagir com os poucos leitores e, honestamente, não sinto a menor falta disso. Sou fechado. Aqui não seria diferente.
Entretanto, por mais que eu esteja 5 horas atrasado, eu não pude deixar de lembrar que ontem, dia 25 de março, foi comemorado o Dia do Orgulho Gay. Sendo o mais sincero possível, não sei o que se passou comigo, porém um súbito desejo de expressar-me, de falar, de escrever, tomou-me conta. 
E eu preciso falar. 

Declaração Universal dos Direitos Humanos:
Artigo 1
Todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade.
Artigo 2
I) Todo homem tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos nesta Declaração sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição. (...)

É lindo e é justo. É poético e, na prática, é uma mentira. E as provas são claras. Segundo o Grupo Gay Bahia (GGB), no ano de 2013, um homossexual foi assassinado a cada 28 horas no Brasil. Durante todo o ano. Pelo simples crime de ser gay, de se relacionar com pessoas do mesmo sexo. Por saírem dos padrões. 
Eu não consigo ver a morte de um gay. Eu vejo o assassinato de um ser humano. Um semelhante. O que o Zé da padaria ou o João do mercadinho ganham ou perdem se seu vizinho sai com homens? O que o torna diferente?
Nós, gays, somos dotados de todos os atributos que um "ser humano normal" detêm. Pagamos nossas contas, vamos ao trabalho, saímos para nos divertir com nossos parceiros (ou parceiras). E - surpresa! - sim, nós nos beijamos - e sentimo-nos tão felizardos como quando um homem beija uma mulher.
Então, sob quais direitos essa sociedade hipócrita pode nos privar de nossa felicidade? Sob quais méritos somos julgados como escória, como errados, pervertidos, pecadores, criminosos? Sob quais direitos somos submetidos ao medo de sair de uma festa em um domingo de manhã, carregando o receio de ser espancado, agredido, ferido, humilhado, abusado, morto?
Eu, como gay, tive muito medo, no início. Tive medo por ter vivido 16 anos da minha vida imerso em uma sociedade preconceituosa e machista, onde me ensinaram desde cedo que homem gostar de homem e mulher gostar de mulher era errado. Fui privado, por pessoas absolutamente próximas, a comprar uma simples camiseta roxa por que "roxo é a cor do gay". Fui ensinado que "o Cazuza só era um grande poeta, por que de resto era um depravado, pois era gay". Quanta tolice.
Minha sexualidade é natural, e não uma escolha. Eu sou assim. Eu sou assim e reneguei isso por 16 anos. Reneguei à exaustão, reneguei até que não suportasse mais, até que a sanidade me deixasse. E, junto dela, que quase minha vida me deixasse também. 
A pressão social foi tão cruel no meu psicológico, que eu não queria ser mais um ser humano tão errado, que gostava de garotos. Eu não queria ser uma vergonha para minha família, o motivo de gozação para meus colegas. Eu queria ser "normal". Mas não podia.
Eu já tentei colocar um ponto final na minha vida, e o apoio de determinadas pessoas durante essa fase delicada da minha vida foi essencial para que eu não repetisse a tentativa e, dessa vez, quem sabe, obtivesse sucesso.
Hoje, com praticamente 21 anos, eu posso dizer que me orgulho de ser assim, gay, e tão normal quanto qualquer pessoa. Meus relacionamentos, meus círculos de amizades e diversos outros papéis sociais foram drasticamente influenciados por todo o preconceito que, mesmo que indiretamente, sofri. Costumo dizer que tenho uma mente quebrada. Arredia. Mas isso eu sei que é passageiro. E, mesmo carregando meus traumas, consigo erguer a cabeça e dizer "você não é ninguém que possa me classificar, me julgar e me depreciar. Eu sou gay. Sou humano. E essa integridade ninguém nunca há de roubar-me".
Pergunto-me o que o cidadão tradicionalista, que ergue placas de apoio a intervenções militares em protestos como o do último dia 15 de março tem na cabeça. Ou o que o mesmo cidadão tradicionalista sente na sua suntuosa mesa de café da manhã e leia em seu jornal sobre a Parada Gay e chame a todos de depravados. Pergunto-me o que se passa nas mentes de pessoas como Levy Fidelix, Marco Feliciano (este machista e homofóbico de marca maior). Pergunto-me se existe consciência em pessoas que acreditam que uma família só pode ser denominada como tal se seguir o "modelo padrão" de homem, mulher e filhos. Pergunto-me se todas essas pessoas são felizes. Pergunto-me se elas percebem que, além de ofender uma classe que por si só já é frágil, cometem crimes diariamente. Seriam esses crimes perdoáveis para essa parcela da população? Não comecei este texto com os dois primeiros artigos dos Direitos Humanos à toa.
Entretanto, acredito em um futuro melhor. Acredito que um dia viverei em uma sociedade onde poderei ver héteros, gays e lésbicas andando pelas ruas de mãos dadas sem se preocupar com o que vão pensar. Acredito que posso ver o dia onde não seremos maltratados e que não teremos direitos básicos negados. O dia que nos verão como família. O dia em que o jovem não sentirá vergonha de dizer aos seus amigos e à sua família que é gay. Que não seremos mortos por sermos quem somos.
Como dizia Chico Buarque, amanhã vai ser outro dia...

[Fernando M. Minighiti][26.03.2015][06:01]

Como se já não tivesse me estendido o suficiente, aproveito para deixar registrado um último recado acerca do Dia do Orgulho Gay. Uma linda lição do magnífico Allan Jones que todos deveriam seguir, em busca de dias melhores. 

“Eu, que pretendo solene dispor cuidadosamente das palavras a fim de não desrespeitar quem quer não mereça, venho, em nome de toda autoridade que eu não tenho e nem preciso, pedir-lhes que deem fé a este comunicado:
Que fiquem, a partir de agora, desinterditados o carinho e a safadeza entre:
As cidadãs e as outras cidadãs das cidades
os cidadãos e os outros cidadãos
a cidadona e seus cinco cidadãos
a outra cidadã e os seus oito cidadãos
o cidadão e suas 17 cidadãs infláveis…
O porteiro do prédio e o limpador da piscina do prédio. Seja na portaria ou na própria piscina do prédio, que não tem porta e, sendo assim, fica mais fácil de tomar banho escondido e abraçado na água morna, cantarolando as canções de Andaluzia que aprenderam às 5h15 da manhã com seus companheiros de orelha.
Que se desproíba também a vendedora de salada de frutas e a mulher que saliva ao ouvir o sininho pendurado na moto da vendedora de salada de frutas. A mulher que desce as escadas com água na boca, e toca mais uma vez o sininho, e saliva. E sorri. E sonha subir naquela moto e correr por todas as ruas do mundo, correr até que se acabe o petróleo que fabrica a gasolina, só para que elas possam ficar perdidas em qualquer asfalto longe, só para que elas possam tocar aquele sininho o mais alto que puderem, até as mãos se desmancharem, para que todo mundo saiba que, há quatro meses, elas nem aguentam comer mais a salada de frutas. É que elas salivam, e que sorriem e que se encontram mesmo é pela língua da boca uma da outra. E pelo som delicioso que elas juram escutar daquele sininho.
Que a juíza de Direito Maria Aparecida dos Santos possa finalmente usar em algum porta-retrato o presente que ganhou da travesti Vivian Lolita: uma foto em que se abraçam e uma dedicatória em que se diz: ‘Maria, desculpe a falta de decoro, mas é que eu não vejo a hora de sair do teu armário, me leva pra rua, lembra? É só a parte de fora do meu peito é que não é de verdade. Que fique permitido o nosso abraço’.
Que a partir de agora fiquem terminantemente permitidos todos os abraços. Os abraços dos braços ou os abraços das pernas. Sejam essas pernas cabeludas ou raspadas. Pretas ou brancas. Listradas ou azuis!
E que a única coisa que fique terminantemente condenada seja o desrespeito e a utilização de métodos de estiramento capilar na cabeça de pessoas como o Excelentíssimo Senhor Deputado Pastor Presidente da Comissão de Direitos Humanos deste país. Condene-se o preconceito contra os cabelos que nascem duros e contra os paus que ficam duros pelo que quer que seja! Contra o amor ou contra o cu de quem quiser que exista. Fiquem eles proibidos. E quanto aos outros e outras, que continuem fodendo e lutando por dias mais bonitos.”

[Da discursiva][Allan Jones]







terça-feira, 24 de março de 2015

Sobre a morte de Pierrô

Era fim de noite, quase o dia seguinte, quando ele parou o carro em frente à casa. Mesmo assim ele não se importou. Sabia que eram noturnos e não se enganou: luzes indicavam a vivência do local. Era sábado. Ele abaixou o retrovisor, encarou o seu rosto no pequeno espelho e não o viu. No lugar dele, uma suntuosa máscara veneziana cobria sua face. De um dourado pálido, tinha linhas em vermelho sangue e alguns brilhos. Sobre a cabeça, magníficas tiras que lembravam tecidos estavam estiradas displicentemente para o alto, só para caírem suavemente em direções opostas.. Sob a ponta de cada uma dessas tiras, sininhos. A máscara acabava na altura de seus lábios, no final de suas bochechas, mas isso também era encoberto por um enorme e pontudo nariz, que passava uma imagem ameaçadora àquele bobo da corte de Veneza. 
Saiu silenciosamente do carro negro, e mais silenciosamente ainda fechou a porta. Também vestido todo de negro, caminhou até o porta malas. Lá, sacou uma pá. Era só disso que precisava. O outro item, seu revólver, já estava em seu bolso. 
Com a pá nos ombros, não caminhou para a casa. Em vez disso, dirigiu-se ao lado oposto e começou a pisar em um chão de terra úmida. Devia ter chovido naquela manhã. Sem hesitar, pôs-se a cavar. 
Era a primeira vez que cavava, mas não havia muitos segredos em se criar uma sepultura. Inicialmente, pensou em fazer vários exemplares dela. Repensando, porém, decidiu que uma bastaria, pois isso representaria união, em todos os aspectos. Era lindo. Era poético. Artístico. Assim como ele. Com todo o cuidado do mundo para sujar-se o menos possível, cavou, cavou e cavou. 

A casa cheia, o coração vazio
O veneno acabou, a festa esvaziou
O tempo da inocência terminou.

Cavou, cavou e cavou. Pouco mais de um metro e meio. Rasa, sim. Mas nada além do necessário, o suficiente para não ser feio, e sim artístico. Artístico. Como ele. 
Pulou para fora da cova. Caçou uma pedra. Achou uma grande, relativamente redonda. Fincou-a na base da sepultura. E isso era tudo. Não haveria de ter nomes ali. O espólio daquela vergonha não haveria de ser lembrado. Ela haveria de morrer como indigente, sem herdeiros, sem memória. Sem legado. 

Eu pude ver o sol desaparecer do seu rosto, dos seus olhos, da sua vida.

Desaparecera, e não nasceria novamente. 

Colocou a pá novamente sobre o ombro (esquerdo), e voltou para o carro. Não parou neste. Continuou para a casa. 
As luzes estavam acesas, mas ele não tocou a campainha. Preferia uma estrada mais apoteótica, Artística (como ele). Sendo assim, pegou certo impulso e chutou violentamente o portão. O barulho causou alvoroço nos moradores não só da casa, mas de toda a rua silenciosa naquele início de madrugada. Mas isso não o impediu. Duas, três, quatro vezes. Na quinta tentativa, o portão cedeu. 
À essa altura, um homem já havia saído de casa, ao passo que não pôde continuar velozmente e caiu. Sem dar atenção a ele, o bobo da corte continuou seu caminho. Livrou-se da pá (que caiu perigosamente perto do homem no chão), e sacou seu revólver. 
Destravou-o com uma mão, enquanto o apoiava com a outra, e isso lhe trouxe tanto prazer quanto estalar seus dedos cansados - por que no momento que que se tocaram, seu dedo transformou-se no gatilho da arma, uma extensão de seu braço, assustadoramente natural ao seu corpo. 
O bobo veneziano adentrou a casa, e algumas mulheres avançaram sobre ele, ao passo que algumas bofetadas as deixaram imóveis. 
Foi então que um homem surgiu, e o levantou pelo pescoço, grudando o bobo na parede. Ele sentiu o ar esvair-se de seus pulmões, enquanto esperneava. Esperando não dar motivos para mostrar-se fraco, amoleceu seu corpo, ao passo que a mão do homem soltou o pescoço do bobo. Este, então, desferiu um golpe com a arma na cabeça do outro. Sangue jorrou em diversas direções, mas o homem não estava morto. Apenas caiu, e no chão permaneceu. 
E ali estava ele, o último homem: a morte, a solidão, a descrença. O lado negro do amor. A perdição. E doçura insuportável. A perfeição.
Nenhum dos dois fez nada por alguns segundos. Até que o bobo disparou, e voou, por que a arma era dele e era ele. Seus dentes sentiram a carne dilacerada de raspão pela bala, por que ele era a bala, em sua raiva e mágoa, em sua culpa e sua sensibilidade. Ele sentiu o sangue, e dele bebeu enquanto o outro caía no chão, urrando de dor. 
Ele urrava, e o som não era bom. Ele urrava, e isso incomodava os ouvidos do bobo. Ele não queria sofrimento. Ele era um bobo. Ele não era triste. Ele não aceitava tristeza. Ele não tolerava. 
O bobo avançou sobre o homem ferido. Ele não aceitava tristeza. Sentou-se no peito do rapaz, o qual gemeu um pouco mais alto sobre o peso ossudo do bobo. Ele não deveria estar chorando assim, ele não devia estar gritando assim, ele deveria se calar. 
Sacou seu revólver e disferiu uma coronhada no rosto do homem. Mais sangue espirrou, manchando suas roupas pretas e deixando o vermelho da máscara ainda mais pálido. O homem, ao menos, havia parado de demonstrar sua dor.
Lentamente, artisticamente, o bobo segurou o nariz pontudo da máscara, que era o seu nariz, e removeu-a. 
O homem por baixo do bobo viu, então, em meio à uma visão ensanguentada, que o bobo não era um bobo. Era um palhaço. 
A tinta pálida cobria seu rosto por completo. Uma espécie de batom negro cobria seus lábios, assim como seu olhos também estavam escuros e borrados, contrastando com a palidez geral de sua face. Em uma das bochechas, a única cor que se realçava: uma grande lágrima pintada de azul.
-Porque choras tanto? - sussurrou o palhaço. - Por que choras?  
Suave e artisticamente, introduziu o cano do revólver na boca ensanguentada do homem, enquanto descia seus lábios negros para o ouvido dele.
-Pierrô só queria Colombina. - continuou sussurrando, cada vez mais espaçadamente, mais ofegante, mais embargado, terrível e descontroladamente embargado. Aquilo não estava nos planos, - Colombina deveria largar Arlequim e vir para seu Pierrô. Mas ela não voltará para este Pierrô. Nunca mais. Nem ela, nem ninguém.
O palhaço triste tremia. Aos poucos, seu dedo já era seu dedo novamente e, num ímpeto, livrou-se da arma. Com um salto, deixou o homem no chão, livrando-o dos ossos de Pierrô.

Por mais que doa, não é maravilhoso sentir?

O palhaço olhou ao seu redor. Todos aqueles que machucara estavam vivos, e observavam a cena apavorados - mas não menos agressivos, defensivos. Era o instinto de sobrevivência que reinava naquele local.
Lágrimas verdadeiras, transparentes e não azuis, e nada artísticas, brotaram nos olhos negros do palhaço triste, e assim sua fraqueza foi mostrada ao mundo. Não lágrimas de medo - ele já sabia o que iria se passar ali - mas, sim, lágrimas de tristeza e de arrependimento. 
-Desculpem-me - ele sussurrou para todos e para ninguém. - Eu só queria Colombina.
E correu. 
Voltou pelo portão derrubado, e desvencilhou-se da multidão que observava a casa, até poder chegar na sepultura que ele havia cavado, quando ainda era um temível e artístico bobo da corte de Veneza.
Lá, em profundo pranto, ajoelhou-se e regou a cova com suas lágrimas, fazendo de seus soluços as vezes dos sinos.
Foi quando a multidão se abriu, e todos aqueles que ele agredira, homens e mulheres, apareceram, formando um meio círculo.
No centro, mancando, apoiado em duas mulheres e com a arma que o palhaço deixara para trás em suas mãos, esteva o homem mais ferido, o único que tinha sido atingido de raspão, pelo único tiro desferido.
O palhaço nada disse. Apenas deu as costas à sepultura cavada e levantou-se, enquanto se forçava a encarar todos ali.


Vão tentar derrubar, que é pra me ver crescer.
E, às vezes, me matar, que é pra eu renascer como uma supernova que atravessa o ar.

Pierrô fitou Colombina e Arlequim. Eles eram, hoje e para sempre,  indissociáveis.
Diferente do que o acertara de raspão, o tiro que o rapaz desferiu contra Pierrô fora certeiro, e este morreu antes de atingir o solo. Mas se ele pudesse ter tido a oportunidade de presenciar a cena, teria visto que seu corpo caiu artisticamente na sepultura que não cavara para si, mas que lhe serviu como uma luva.

[Fernando M. Minighiti][24.03.2015][01:08]


quinta-feira, 19 de março de 2015

Com ou sem razão

Alguém me disse
que você já está bem -
que só pelas manhãs
é que fica mal.
Mas que tudo passa
quando a tarde chega,
e quando a noite anuncia
suas lindas estrelas.

Então me diga por que eu
deveria morrer
pra te ver feliz?
Por que
sofrer só
pra te ver sorrir?
Será ego ou solidão?

Alguém me disse
que seu coração já voa,
e o que o prende
é um fino arame
que não vai suportar
ao calor do verão,
e te deixará voar -
São duas ou uma paixão?

Então me diga por que eu
deveria me abaixar
pra você passar?
Por que
me calar
só pra te agradar?
Sou eu, com ou sem razão.

Alguém me disse
que você adora frases,
que elas te motivam,
dão sentido à sua vida.
Mas só não se esqueça
que sim, somos ardilosos.
(É que criamos essas mentiras em que acreditas
para tolos orgulhosos).

Então me diga por que eu
deveria me contornar
por algo que não vai vingar?
Por que
me desgastar
com quem não compreenderá?
Serei eu e a solidão,
com ou sem razão.

[Fernando M. Minighiti][13.03.2015][06:13]


sábado, 7 de março de 2015

Últimos desejos

Eu quero a árvore, novamente. Não qualquer uma. Quero a adrenalina da subida e a tensão da descida, só para sentir a única garoa fina que não me irritou em quase 21 anos de vida. Quero sentir o frio que, em minha pele, não é exatamente frio, e nem preciso usar um agasalho enquanto caminho em busca de pontos de ônibus e táxis que não conheço. Quero aquele protótipo de cidade grande e, por isso mesmo, tão meiga e graciosa. O prazer da estadia também. É bom ser tratado como adulto e com todas as regalias que a gente acha que nasceu para ter. Quero aquele modo estranho de falar e o olhar de ódio que na verdade não é ódio, só um modo fechado de ser. Quero os lenços, as botas, o chapéus, a música, o parque sem grades, o lago, o rio, o pôr do sol. Ah, o pôr do sol! O queria novamente e, de preferência, que fosse um pouco mais eterno do que cinco minutos. Queria o concreto arborizado, assustadoramente arborizados. A galeria erroneamente denominada shopping. Tudo isso na mais profunda solidão. A brisa seria minha companhia, além do líquido amargo com aquele maldito canudo (sempre será um canudo pra mim) metálico condutor do calor do Inferno. E só isso. 
Queria também voltar a ter uma família. Queria a rotina novamente: colocar a mochila na roupa no quinto dia útil e só voltar para a realidade no primeiro, talvez no segundo dia da semana seguinte. Quero voltar a ter lições de nado, e depois imaginar-me, novamente, um adulto, pois estaria sendo tratado como um. Quero dormir em um colchão sob um tapete felpudo com um calor móvel ao meu lado. Queria as noites mais bem dormidas - e coloca bem dormido nisso. Queria lembrar de meus professores sempre que me mudasse, mesmo que por alguns dias, para aquela rua. Queria voltar a ter planos maiores, e ser uma pessoa melhor. Sim, como queria ser uma pessoa melhor. 
Desejo, também, um carinho tímido. Quem sabe receber uma outra carta? Não. Nunca. Não? Sim? Talvez? Talvez agora eu escreva uma, mas o carinho nunca mais seria o mesmo. Ao menos acho que não seria. Será? Mas sinto isso também. Aquela mente assustadoramente profunda, seus pensamentos irritantes de tão complexos. Queria seus olhos, mais analíticos do que o normal. Sua cumplicidade. Sua doação integral, quase doentia, amavelmente doentia, duzentos por cento. E as cervejas. E as piadas inesperadas depois de bêbados. E a velha rotina.
E, acima de tudo, só queria uma pequena inocência. Aquela que já tive, e que todos um dia tivemos. Sentir aquela ansiedade novamente. Aquele frio na barriga. Aquela certeza inabalável de que tudo dará certo, por mais que você se esconda em escadas de emergência para que ninguém veja o crime que praticas contra a parcela conservadora da sociedade. Ah, como eu queria aquelas dúvidas monstruosas que hoje tornaram-se grãos de areia. Como queria aumentar o brilho do mundo como na tela do meu smartphone.
Mas, depois de tudo, essas coisas todas não passam de lembranças. Boas e, em sua maioria, ruins. Talvez o que eu realmente queira seja apenas a reclusão.  Seria interessante passar uns bons meses sem a sensação de que daqui a algum tempo poderia estar me lembrando de outro erro, ou de outra coisa boa que se foi, como pássaros que aprendem a voar. Talvez eu seja isso. Talvez eu seja um ninho, um ninho bem aconchegante, modéstia à parte. Lá, um ou outro pássaro se aconchega, se apetece, aquece, cresce. E, quando está pronto, voa para o mundo. Ou então o vento aperta, em determinado inverno, e eu me balanço no galho da árvore da minha vida e expulso o pobre pássaro de dentro, que é obrigado a viver e ser feliz sozinho. Talvez essas lembranças sejam apenas reflexos de uma incrível falha do meu cérebro ou do meu jeito de ser. Ou talvez elas só querem dizer: "tudo o que quero é inverter os papéis e me tornar um pássaro e eu juro, juro, nunca mais voarei para longe do meu ninho."

[Fernando M. Minighiti][07.03.2015][20:10]


Criação, prazer, lixo, tédio e criação

Felicidade não existe. Sob nenhum aspecto. O que idealizamos é uma farsa - a felicidade eterna, duradoura -, assim como o que nos é vendido. Ela não existe, e ponto. Ela é um raio de luz, uma visão meteória fugaz: em um segundo, acreditamos que ela está lá, assim como vislumbramos um cometa riscando o negro do céu e, também como ele, no segundo seguinte tudo desaparece. E tudo o que possuímos é a dúvida de se realmente o que sentimos foi uma prova do conceito de felicidade; se realmente avistamos um cometa em atrito com a atmosfera ou se foi só a nossa vista cansada de olhar para as estrelas. 
Apresento ao júri minhas opiniões completamente arbitrárias sem a mínima cerimônia ou protocolo, isentando-me da tarefa de criar sentido lógico para o leitor ou de unir todos em um maldito senso comum. Faço uso da liberdade que possuo desde o momento em que respiro, único bem do humano. Leiam as palavras deste réu acusado de presenciar passivamente o assassinato de uma concepção.

Desde crianças aprendemos a buscar nossa felicidade. Então o jovem estudante irá se esforçar para tirar ótimas notas e, assim, conseguir entrar em uma universidade conceituada. E isso o torna feliz por alguns semestres, até que ele só se veja feliz novamente quando for capaz de sair da mesma universidade com tantas honras quanto entrou. Ele então se forma e, do mais alto posto de estudante, decai para a mais baixa posição na empresa que entra para exercer a profissão e sim, isso o deixa feliz. 
Essa felicidade é minguada e reposta a cada cargo que ele evolui ao longo dos anos na empresa. Até que encontra a mulher (ou o homem) da sua vida e sua felicidade chega ao ápice. Como poderia ser mais feliz? A busca por todos seus anseios fora saciada, e isso o fazia se orgulhar. 
E quando ele se vê de posse de tudo o que desejava desde pequenino, ele avança. Casamento, casa, família, crianças, emprego, rotina. E isso o cansa. A sua própria criação o trai, o abandona.
E as perguntas surgem. A vida cobra. Quem impôs o casamento? Quem decretou que ele iria dedicar-se anos a fio, interruptamente, aos estudos de uma profissão que não lhe traz felicidade como a sua idealização trazia? A felicidade do homem, então, passa a resumir-se aos dias de pagamento, ao segundo anterior e posterior - e nada além - do gozo. A companhia perde a graça. O emprego perde a graça. A vida perde a cor. Onde estaria a felicidade? Morta? Teria ela existido?
Este homem fictício, então, procura desanuviar em um bar e entrega-se ao prazer da bebida. E o copo de cerveja lhe traz satisfação, a sensação de desejo saciado, de felicidade novamente. Sensação essa que é menor no segundo copo. E menor no terceiro. E quase inexistente no quarto. 

Isso por que o homem é um ser ingrato. Incluo-me neste grupo. Ele é capaz de criar objetos, situações, momentos ao seu bel prazer com a única finalidade de entreter-se, de passar seu tempo e de satisfazerem-se. Com a finalidade de sentir essa tal de felicidade. E, assim como criaram, desfazem-se de tudo quando o sentimento primeiro já não for duradouro o suficiente para os manterem entretidos com a ilusão de alegria. Então, subindo novamente a colina, eles se entediam. Criam. Constroem. Divertem-se e, ao chegar no final do vale, após o frenesi da descida, se desfazem novamente. 
É ciclo. É regra. Criação. Prazer. Lixo. Tédio. Criação. Prazer. Lixo. Tédio.
Tudo se resume única e exclusivamente no ato da busca. A busca ao prazer. A busca à felicidade. À satisfação.
Isso, claro, se ela for aceita e legitimada socialmente. O prazer que eu sentiria matando alguns semelhantes meus me é negado. Matar é socialmente errado. Sendo assim, essa felicidade me é privada e ninguém se importa. Assim como ninguém se importa com pedófilos por natureza e que nunca abusaram de nenhuma criança, por exemplo.
Sofremos por buscar essa felicidade inexistente, e sofremos quando ela se mostra efêmera. Por que nós somos assim, insaciáveis, egoístas. Gananciosos. 
Talvez o "não ter" traga mais felicidade do que a posse dos sonhos nas palmas nas nossas mãos. Assim não teríamos nada para nos cansar, jogar fora, e buscar novamente. Ao menos é isso que estou me forçando a pensar ao perceber que minha "felicidade" foi mais efêmera que o normal ao desejar fumar e perceber que meu maço estava vazio. 

[Fernando M. Minighiti][07.03.2015][04:51]


segunda-feira, 2 de março de 2015

Dancing through the night

That girl has a smeared makeup, but she doesn't mind.
A few drinks, few guys, just beginning the night.
She thinks is right, but everyone look as if she was wrong.
She thinks is right, they think is wrong,
So, she become wrong.

But she loves dancing through the night,
'Cause if she stops, she falls apart.
While it doesn't end,
She'll be on the dancefloor,
Too busy making herself reborn.

One day she obeyed what to think, what to say.
But this night is her night, and no one would take it away.
So she were right, is her right, 'cause no one could see your pain.
Where's her pain? Where's her pain?
Gone away, returns when the day rise again.

That's why she's dancing through the night
'Cause when she stops, she'll fall apart
She prays for an endless night,
To stay on the dancefloor,
Too busy making herself reborn.

[Fernando M. Minighiti][02.03.2015][03:38]




quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015

Estrelas

Para Nicole
Não se vire,
o passado é longe demais para alcançar.
Olhe para frente,
faça do futuro um espelho e tudo será o mesmo.

Você se lembra
de quando o tempo era eterno?
"Responsável"
era para os pais e para as mães.
Não há mais volta.
E se o futuro for amargo
deixe-me aquecer em você?

Oh, eu,
Eu velho nostálgico
de apenas vinte e poucos anos,
procurando respostas
sem saber aonde ir.
Pegue minha mão.
Nós somos duas pequenas estrelas
tentando sobreviver 
ao temível amanhecer.

Não se esqueça:
Aquilo que foi bom ainda vive em você.
Olhe para mim,
e enxergue através de uma década.

Você não vê
que tudo o que eu sou resulta de você?
E que a solidão 
se abrandou quando você chegou?
Se escurecer, 
brilhe como um diamante precioso, 
e eu irei seguir a sua luz. 

Ontem eu estava contando os dias,
quando eu vi que eram anos.
E quando eu penso no futuro,
você está presente nos meus únicos planos.

Oh, nós,
velhos nostálgicos,
de caminhos tão tortuosos,
que se encontraram,
e que nos levarão ao céu.
Meu bem, seremos estrelas.
E, quando a manhã nascer,
juntos, iremos sobreviver.

[Fernando M. Minighiti][25.02.2015][00:51]







sexta-feira, 13 de fevereiro de 2015

O velho amigo

E sentiu a culpa
Corroendo sua pele
Pensou que não respiraria antes do fim.

Ela viu a noite
E sua eternidade
Relutante,  teria que aceitar.

E farejou o bosque
No rastro do medo
Encontrou seu sangue derramado.

E em cada floco
Ela sabia
Que era ao frio que pertencia.

Sem mais dor
Ela afundou
Abrace a escuridão como um grande, velho amigo
E nunca estará sozinho
Até que o silêncio
Seja o único som.

Sua vida amaldiçoada
Ela desperdiçou
A fantasia jamais presenciou.

Pois perecível
Era o batimento
Eternidade apenas no sofrimento.

E sem mais dor
Ela se entregou
Abraçou a escuridão como uma grande, velha amiga
E nunca mais esteve sozinha.
Com pedras nos bolsos
E bolhas de ar negro.