Senhoras e senhores membros do júri. O juiz que vos fala inocenta os presentes réus de todas as acusações, os isenta de quaisquer sentenças e declara-se ele mesmo culpado por todos os crimes aqui citados, e por todos que ainda ocorrerão, minuciosamente abaixo citado:
Pela podridão etílica na bile já ácida, declaro-me culpado pela supervalorização do vinho e a ausência do pão (alego que nunca fui tão cristão). Não há nada pior do que uma alma faminta, e que isso recaia sobre mim também. Nos bolsos. Eles têm espaço de sobra.
Pela língua pegajosa, podre, fétida; pelos dentes ásperos; culpado pela ausência do creme dental. E se são menos beijos, ou se até mesmo eles já não são o que eram, é fruto de meus delitos, também.
Culpado por pintar um sol majestoso em uma trégua de uma semana na frente fria. Culpado pela tolice de acreditar que ele seria sustentado em um firmamento invisível e seria forte, duradouro.
Declaro-me culpado por dizer palavras impróprias nos momentos impróprios. E mais do que isso. Confesso o delito de cerrar meus lábios enquanto penso nessas palavras impróprias, mesmo que não as verbalize, pois elas sempre estarão lá, na minha cabeça, e não tenho planos de me arrepender e tirá-las de lá.
Imputo-me como pior tipo de réu, aquele que não demonstra arrependimento. Pois não me arrependo. Uma semana de delitos, por vezes, valem uma vida, e esta é a única vida sem culpa que posso viver.
Senhoras e senhores membros do júri. Que seja dada a sentença a esse juiz-réu, preso, torturado e condenado pelo crime de ser sonhador.
[Fernando M. Minighiti][27.06.2015][16:03]
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