sábado, 26 de novembro de 2011

O Sol

E eis que o Sol surgiu. Criou-se assim, por vontade própria mesmo. Numa solidão quase que arrebatadora, na ausência de alguma intervenção divina, simplesmente apareceu. Percebeu então, em si mesmo, suas próprias proporções magníficas. Era um titã, um colosso. Perfeito em cada forma, em cada ângulo. Imponente, experimentou de suas chamas o calor irresistível. Apreciou suas chamas, suas explosões colossais. Era poderoso e grande como o Deus o que havia esquecido. Quando, por fim, terminou sua primeira auto-avaliação, voltou seus olhos vermelhos para o que via em volta. Era um lugar estranho aquele. Não havia ser algum lá em baixo. Apenas o nada. Percebeu colinas, talvez montanhas. Cursos de rios que se moviam como cobras sinuosas em direção àquelas grandes áreas azuis que cobriam a maior parte daquilo que iluminava. A princípio, sentiu-se sozinho. Para quê viver, aquecer, não havia ninguém a lhe adorar, santificar? Uma vida sem apoteose valia a pena? Valia, o Sol pensou. Ele era grande o suficiente, reluzente o suficiente para precisar de alguma coisa além de si mesmo. E era assim. Era belo.
Anos passaram. Décadas de luz incandescente. Séculos de grandiosidade. Milênios de explosões abrasadoras, da exposição de sua grandiosidade. Quem se aproximava demais de sua auréola incandescente era penalizado com a morte, por que ele estava se sentindo traído, trocado. Renegado: Agora, sua paisagem havia mudado. Não era natural. Os rios já não pareciam cobras a deslizar, não havia mais solidão: Rotas de objetos voadores pousavam em todos os lugares, em todas as construções que haviam feito. Tanta podridão o enojava. Não era para ele. Abusavam de sua energia preciosa para realizar mais e mais atrocidades. Não que as atrocidades que eles cometiam lhe aborrecesse. De modo algum: Seria um favor que eles destruíssem uns aos outros, até não sobrar nada, pedra sobre pedra. Por que qualquer ser vivo que não o adorasse, que não percebesse o quão colossal e imponente ele era, não merecia nada além da morte. Então, ela veio. Ácida como um veneno, mas linda como uma amante. A Chuva não parava de cair um só momento. Cobriu tudo o que o Sol estava acostumado à ver durante sua existência. Toda a imundice estava sendo lavada até à sua alma corrompida. Tudo estava findando.
E então, aconteceu: Através de toda a acidez, o Sol viu a coisa mais bela de todos aqueles anos solitários. Ele viu, além de toda a água que caía sem parar, um enorme arco, quase um círculo perfeito de cores. As mais belas que havia visto. Nem de longe se assemelhava ao cinza das poluições humanas. E ele desejou tê-las para si. Aquilo precisava ser dele, e o Sol percebeu o quão egoísta fora todos os anos de sua vida. Como pôde ousar imaginar que a sua existência estava completa sozinho? Ele não conseguia mais lembrar-se de como conseguiu continuar sua eterna combustão sem aquele círculo de cor ao seu lado, nem conseguiu mias imaginar como seria sua vida sem ele.
Então, se aproximou das cores. Os respingo batiam em toda a sua extensão, e aquilo doía. Quanto mais se aprofundava, mais dor sentia. Mas elas não representavam muita coisa: ele estava perto daquelas cores hipnotizantes, amáveis, sedutoras. Tomou um último impulso e avançou. A dor foi excruciante, toda aquela água a queimar-lhe o próprio fogo. Então, a água virou uma garoa, e a garoa cessou. Seu corpo estava intacto - ainda queimava imponentemente, mas com a garoa foi-se o arco de luz. E ele estava novamente por si só.
Olhou para baixo: A devastação era completa. Toda a impureza havia sido corroída. Por que será que ele não se sentia mais tão imponente? Tão importante? Era ele um ser colossal, auto-suficiente, não deveria ser assim. E então, pela segunda vez em milênio, olhou-se novamente, e fez sua segunda auto-avaliação. Era mesmo colossal, imponente, abrasador e importante perto daquele fulgaz e indescritível círculo de cor?
E o sol percebeu que não poderia mais ser tudo o que um dia foi sem que aquele Arco-Íris fosse seu - por que quando a chuva se foi em garoa, levando o arco para longe de si, o arco levou um pouco dele junto. O gloriosos Sol estava incompleto.
Séculos passaram-se, e a chuva torrencial por vezes retornava. Com ela, a imagem bela. E, em todos esses raros momentos, o Sol se empenhava a alcançá-la. Mas sempre que tocava a grande cortina úmida, sua grandiosidade a fazia cessar, e o Arco-Íris levava cada vez mais uma parte dele.
E o Sol ficava cada vez mais incompleto, pois a cada investida, mais de si perdia, e mais dor era capaz de sentir. Mas ele não percebia isso. A imagem daquilo pelo qual estava apaixonado aliviava todos esses sentimentos. Até mesmo o fato de que ele nunca poderia possuir o que desejava, o que amava.
O tempo passou. Milênios. Mais do que se pode contar, mais do que se pode expressar. Deve ser o fim do mundo, pensou o Sol, pois ele não imaginava mais como aquele pequeníssimo globo que ele sempre iluminou resistiria à mais aquele chuva torrencial que estava caindo. Ele não ligava mais para as atrocidades dos seres que estavam sendo corroídos agora - eles já eram previsíveis - nem com as belas paisagens que também estavam sendo mortas agora injustamente. Ou se quer com o fato de nem um ser que raciocinasse lhe adorasse. Ele já não era mais o que costumava ser. Estava pequeno e não queria ser mais adorado. Há muitos milênio não queria mais ser adorado, mas adorava. Adorava aquele círculo colorido. Estava amando. Estava amando naquele instante, enquanto a Chuva caía, observava o imponente Arco-íris do outro lado. É agora ou nunca, pensou o Sol. E, como sempre fazia, avançou sobre a chuva, para tocar a beleza que ela guardava tão bem por tanto tempo.
Anormalmente, a dor o atingiu mais do que nunca. Sentiu-se diminuir, morrer, apagar. Sentia que cada combustão estava cansada de existir, que cada chama diminuía, junto com seu corpo um dia imponente. Não sentia mais a água lhe queimar, sentia tanto que não sentia mais nada. Estava deixando de existir.
E a última visão do Sol foi aquele Arco-íris que tanto amava, o objeto de sua paixão. Ele enfim estava próximo o suficiente para dizer suas última palavras: Eu toquei a verdadeira felicidade.
E, antes que pudesse dizer o quanto o amava e o quanto o agradecia por lhe fazer perceber que sozinho ele nunca tivera a felicidade plena, tudo escureceu.

[Fernando M. Minighiti][26.11.2011][13:13]


quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Anjo (ou Medo, ou Paranóia)

Todo sentimento precisa de um por que para que se torne compreensível. Tudo o que somos hoje é fruto de um passado que explica e nos dá esses "por quês" necessários para a sanidade mental. Acontece que ela não me é concedida, por mais que eu tenha meus álibis. Como posso rir de sua paranóia, se a minha está me esmagando aos pouquinhos? Temo poucas palavras. Por que sinto que alcanço o céu, e a cada dia que passa sinto-me mais como se vivesse um sonho: E essas poucas palavras são aqueles encontrões que tentam me acordar. Não posso comandar seus sentimentos, mas também não posso acordar disso tudo. Sinto que seria demasiadamente doloroso. Eu acredito na vida, sabe. No que estou vivendo. Mas não passo de um doente, paranóico, amaldiçoado por o que já passou, receoso que aconteça de novo, e no receio me afundo em uma necessidade insana de me certificar que estou vivo, que isso é real, que as poucas palavras não significam pouco amor. Você sabe qual é o anjo que está comigo em todos os instantes, incondicionalmente, na minha mente? Sabe que o maior medo é me ver abandonado e ignorado por ele? Será que sabe me dizer o quê estou fazendo de errado em relação ao anjo? Você pode me compreender, pode me decifrar? Pode me perdoar? Pode me acordar se estiver aí fora?

[Fernando M. Minighiti][23.11.2011][8:32]


Todo sentimento
Precisa de um passado pra existir
O amor não:
Ele cria como por um encanto
Um passado que nos cerca,
Ele nos dá a consciência de havermos vivido anos a fio
Com alguém que a pouco era quase um estranho,
Ele supre a falta de lembranças por uma espécie de mágica...

[Beijamin Constant]

Além de todo o medo
No desespero velado
O pensamento mais forte persiste
Além da paranóia
O profundo pedido
A súplica oculta
"Não me esqueça
Não me abandone"

[Fernando M. Minighiti][23.11.2011][8:40]


sábado, 19 de novembro de 2011

Perfeição

Minha exelência em transcrever para as palavras tudo o que me atormenta e o que me desafia talvez seja reflexo da minha enorme dificuldade em expressar tudo o que me faz bem. Então saiba que nada será irá me satisfazer. Por que eu quero a perfeição pra você, mesmo sendo imperfeito. Quero lhe escrever um poema - simetricamente impecável, irresistivelmente tocante. Quero lhe dedicar uma prosa, cascatas de palavras parafraseando meus sentimentos. Mas nada que eu começo fica bom o suficiente pra você. Nada é digno de expressar o que sinto. E o que sinto é que nunca conseguirei expressar o quanto você significa para mim, o quanto representa - e o quanto eu desejo insanamente significar para você. Talvez também não consiga dizer o quanto meus pensamentos são seus, ou o quanto você me modificou. O quanto me fez acreditar que mesmo nos momentos mais obscuros há sempre um meio de encontrar uma luz, um meio de conseguir se guiar, um meio de amar. E muito menos que você é a minha mais doce e bela excessão à regra da minha vida. Minha vida. Que é o que a faz funcionar. Que é pelo quê ela ainda funciona. E mesmo sabendo que nunca serei bom o suficiente para expressar essa e outras gamas de infinitos sentimentos misturados, sinto, também, que você deve ter conhecimento deles, que devo expressar. Mas como alcançar a perfeição? Como alcançar o seu nível máximo? Recolho-me, então, e da forma mais perfeita tento transformar da minha imperfeição esse sentimento que preenche um vácuo que há muito me habitava. Amor. Simples assim.

[Fernando M. Minighiti][19.11.2011][2:40AM]

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Melodia

A dama
E o violino
Tocado
Para o pecado.
Ecos na escuridão.
Aprendeu a viver acompanhada
Pela solidão.

Por que estás trilhando tão escuro caminho?
Por que preferes perder-te de si mesma?
Por que não me permite guiar-te para fora?
Ao menos sabe que és minha mais preciosa estrela?

A vida a completa
Com desesperança.
No pico da loucura
Ela suavemente balança.
E ela se entrega
Aos profundos instintos
À doce, negra melodia
Do violino.

Por que estás tão distante?
Por que preferes esta solidão laciante?
Por que sucumbiu ao mundo, esse farsante?
Ao menos sabe que és minha mais preciosa estrela?

[Fernando M. Minighiti][17.11.2011][20:02]



quarta-feira, 16 de novembro de 2011

A segunda opção do meu egoísmo

Ultimamente, tendo a inclinar-me à duas ideias que me parecem bem propícias ao estranho momento: Estou desistindo de lutar, finalmente, ou é a vida que exige cada vez mais do que posso suportar? Creio estar mais próximo da segunda hipótese: Sinto-me cada vez mais próximo dos limites das minhas forças, no limiar de uma estrada que não poderei seguir. Não sozinho. Então escolho. Com aquele sentimento de angústia eterna de o que poderia ter acontecido se as coisas fossem diferentes, se a escolha fosse diferente, eu escolho. Escolho trilhar outro caminho que aparenta ser mais indolor. A questão, então, se resumi nisso, sim? Quase seis anos de vãs lutas? Mais do que nunca provo o gosto amargo de minha autoridade frustrada. Quero colar vocês uns aos outros. Quero os fundir em uma única criatura, terrivelmente bela, e pagar para vê-los tentar se separarem. Mas isso se chama vontade, e vontade significa fugir do meu controle, e fugir do meu controle  significa frustração. Frustração! Comprovo que tudo o que toco se quebra, e que os estilhaços do que um dia já foi quebrado são cada vez menores - difíceis para se cortar, mas inegavelmente mais difíceis de serem remontados. Então desisto (eis então que tomo como resposta à minha primeira pergunta as duas possibilidades). E cedo, quase com alívio, ao egoísmo incrustado em meu mais profundo e descontrolado âmago: Desde que um certo valor pessoal meu permaneça, em cada um, permanecerei. Por mais que morram entre si, mantê-los vivos em mim é o que me mantém. Até que eu tenha algum significado, eu continuarei - mesmo que em um único ser dividido em várias réplicas, várias vertentes essenciais à vida.

[Fernando M. Minighiti][16.11.11][11:13]



Long ago,
Just like the hearse
You die to get in again
We are so far from you

Burning on, just like the match
You strike to incinerate
The lives of everyone you know

Came a time
When every star falls
Brought you to tears again
We are the very hurt you sold
And what's the worst you take
From every heart you break?
And like the blade you stain
Well, I've been holding on tonight

What's the worst that I can say?
Things are better if I stay
So long and goodnight
So long not goodnight
Well, if you carry on this way
Things are better if I stay
So long and goodnight
So long not goodnight

Can you hear me?
Are you near me?
Can we pretend to leave?
And then we'll meet again
When both our cars collide


[Helena. My Chemical Romance]


I never said 
I'd lie and wait forever
If I died we'd be together now
I can't always just forget her
Ever...
Get the feeling that you're never
All alone and I remember now
At the top of my lungs in my arms she dies
She dies
At the end of the world
Or the last thing I see
You are never coming home
Never coming home
Could I? Should I?
And all the things that you never ever told me
And all the smiles that are ever gonna haunt me
Never coming home
Never coming home
Could I? Should I?
And all the wounds that are ever gonna scar me
For all the ghosts that are never gonna catch me
If I fall
If I fall 
Down


[The Ghost Of You. My Chemical Romance]

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Resquícios de ontém

I
A noite expõe
Em cruel destaque
O que a luz do sol
Ofuscava.
O vento aguça
E aflora os batimentos.
Sangue intoxicado
É agora meu legado.
Uma vida venosa.
Rubra, pastosa.
Esquivos, abismos
Do intolerável amor
Ao incontrolável desejo.
Não escrevo meu roteiro.
Tudo se perderá
No romper de uma luz
Demasiadamente pura.

II
O recluso encontra um meio
De ver através da escuridão.
É a vida que ele vê.
A vida que nunca conseguiu tocar.
A ideia que nunca pôde tolerar.
o sangue que nunca pôde estancar.
É o vazio que o preenche.
Escuridão que compreende.
A prata e suave luz
Quebrada pelas grades
O lembra de quão inatingível
O mundo se tornou.
Prisão da mente.
Sentimento consciente.

III
É a vida que lhe escapa
Como água em suas mãos.
O amor que lhe foi negado.
O sofrimento lhe é inalterado
Permanentemente estático
Apenas exposto
Em cruel destaque
Agora que a luz do sol
Não mais o ofusca.


[Fernando M. Minighiti][07.11.2011][8:06]





domingo, 6 de novembro de 2011

Fatos

Arrisco. Como alguém que não tem medo do desconhecido, inclino-me neste abismo de incertezas, de reações inesperadas. Mas de sentimentos tão profundos que dos quais não sou capaz de enxergar o fundo. Queria ser capaz de tocá-los. Controlá-los, dimensionar ao meu gosto, moldar. Gostaria de criar, com eles, uma ponte até você. Mas uma ponte concreta não é feita para se alcançar incertezas. E quantas incertezas você representa. Quanta complexidade você me impõe. Procuro desvendar-te a cada dia que passa. Agarro-me em suas respostas, e crio uma imagem diferente a cada momento. Mas no fim, me pergunto: Não me desvendas? Não é tão óbvio assim? Sim, deve ser óbvio até demais, uma parte de mim pensa, e então me recluso e aguardo o momento propício. Mas os dias continuam sendo os mesmos. Perfeitos - mas ainda sim iguais: A ansiedade, as ondas de tensão, a calmaria, e o medo te dizer a coisa errada. De dizer mais do que devo. Mais do que você deve ouvir. Se você, pelo menos, me desse sinais claros, se fosse menos difícil de entender, talvez fosse mais fácil. Mas a culpe jamais será sua. Então, caio em contradição - ou, pelo menos, consigo discernir melhor o que se passa. Arrisco em sentir. Ouso em nutrir algo impossível, intangível. Mas guardo todas as formas de expressão pelo receio da perda. E esse é o vento que me traz de volta o equilíbrio à beira do abismo, e me fazem focalizar apenas a distância intransponível entre nós dois. Porque, para uns, um mês não significa nada. Para mim, já significa muito. E, então, fecho minha conta e realizo o meu saldo: O amor é uma dádiva que me foi dada. Amor correspondido é uma da qual, pelo que parece, não sou merecedor. É um trem que nunca irá parar para meu embarque. É uma ausência que faz meu coração bater fora do compasso. Apenas fraquejo sobre meus joelhos e contemplo as estrelas, como se elas pudessem saber o que sinto. O meu destino. Correspondência sempre negada. Por que?

[Fernando M. Minighiti][06.11.2011][22:47]


quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Pequena nota

E eis que venho desmentir meus próprios escritos anteriores, direito esse apenas de grandes autores que me seria negado, se não fosse pela minha alma aspirante a escritora. Não pode haver amor nem sentimentos hoje, por que nunca existirá em todos os amanhãs restantes. Não haverá encontros. Não haverá a vista da escrita. Não haverá aquele momentos constrangedor de gagueira ao vivo... por que me parece que esse dia é algo impossível. Embora eu odeie assumir que, enquanto escrevo essas palavras, estou sentindo sua falta. Que cada vez que vejo a janela aqui em baixo piscar, desejo que seja você. Mas não é. Então, deixe-me matar esse sentimento recém-nascido. Deixe-me esculpir a escultura da minha solidão eterna.

[Fernando M. Minighiti][02.11.2011][19:02]