quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

A Anti-História

Certa vez, ouvi uma canção que iniciava com as seguintes palavras: And now the end is near, and so I face the final curtain. As condições de dramaticidade das quais desfrutava no momento em que a dita música me foi apresentada, obstruíram o que tais palavras poderiam me dizer, no mais profundo âmago. De fato, tudo me foi por demais superficial nas primeiras análises daqueles versos. E hoje, posso arriscar dizer o que elas significam interiormente. Não por dedicar algum tempo à reflexão, já que me seria desnecessária, uma vez que estou vivendo no âmago dessas palavras.
Posso, com toda certeza, dizer que o fim não está próximo, eu o ultrapassei, transpus o final de algo que nunca começou. Estou em chamas. Queimo arduamente cada momento, cada gesto. A cada momento, a cada gesto. Enquanto as chamas tremeluzentes correm meu corpo, um prazer vitorioso que transcende os sentimentos flui por dentro de mim, avisando que a profecia que há muito foi feita, e que ainda ecoa através das chamas em meu ouvido hoje, era falha. Queimo prazerosamente, como se eu implorasse pra que isso não parasse, pois eu sei que o final é outro: Eu não me transformarei em cinzas.
O quanto mudei? O quanto isso foi bom? Mudar faz parte de qualquer ser vivente. A vida é uma mutação. No inicio, preparei-me. Expus-me na mais reluzente vitrine, o rosto elevado, focando o céu imponente e azul, esquecendo-me de reparar no chiqueiro ao qual a vitrine estava exposta. E fui consumido.
Por pior que fosse, seria uma história. E aquele era apenas o prelúdio. Da lama à eternidade. E a lama era apenas o capitulo inicial, a parte onde eram apresentados os personagens (Olá, muito prazer) em suas  piores formas (O prazer é todo meu) e suas expectativas quando o final da história chegasse, quando o momento da eternidade fosse iminente. (Seremos amigos para sempre)
Aquele foi um longo primeiro capítulo. Ou um capítulo 1 eterno? Ou vários capítulos idênticos ao primeiro? Ou então uma história com três longos capítulos, tão longos como três anos? Ou uma história sem capítulos, estagnada, talvez? Meu Deus, aquilo chegou a ser uma história? (Não sei responder a nenhuma dessas questões, quem dirá este meu pensamento mais profundo, mais angustiado e indignado.)
Verdade seja dita,  a obstrução intelectual e a estática de perspectiva eram as palavras de ordem. Nasceste entre os porcos? Então permanecerá entre eles até sua morte. E tal pensamento medieval não me atrai, não me seduz, não me doutrina. Procurei salvar-me, e a quem conseguisse levar comigo. Aquilo não era um lugar para seres "racionais". E, na procura insana pelo capítulo final da história, na minha corrida para a glória, feri-me. Por várias e várias vezes o sangue era tudo o que se passava em meus olhos. O meu próprio. Enquanto as feridas ficavam mais profundas à medida que nos afastávamos, o peso da carga que eu levava - o peso de todos aquele que eram dignos de se salvarem - estava sobrecarregando meus ombros. Até que, por fim, sucumbi. 
Quanto tempo fiquei estático no mais impuro solo é algo impreciso. O fato é que flores mortuárias cresciam ao meu redor, alimentadas pelo meu sangue gotejante, fechando-me em um belo e assombroso túmulo amaldiçoado. E, quando a lua pintava-se de rubi, e o sol perdia sua cor e calor, percebi toda a carga que tinha deixado para trás. De fato, elas permaneciam atrás. Intocadas. Perfeitamente normais. Puras em sua impureza. Viviam, como no início do capítulo, em estagnação de pensamentos. 
Sim. Sangrei para isso. Morri por isso. Dei de minhas forças para salva-los de um eterno capítulo, enquanto a conformidade de um capítulo eterno lhes soava mais atrativa, mas confortável.
Então, corri. E, com a paisagem nojenta, também erra borrado à minha visão imagens de suas hipocrisias, da confecção de suas máscaras e da monstruosidade que elas encerravam. E, pela primeira vez, minha vida real se confundiu com um pesadelo. O que era real, o que deixava de ser, já era irrelevante. Acreditava no que via, no que sentia. E o que eu via era o âmago dos seres mais impuros, e o que eu sentia era repulsa, ódio e mágoa por partilhar momentos dos quais esse âmago era muito bem velado.
Mas sentia também alívio. Sentia que, agora, em meu egoísmo, não sangrava mais, tampouco a dor me torturava. E as terríveis flores funerárias me deixaram, o sol voltou a me aquecer e, a Lua, a me guiar até pela mais negra noite. Não reconhecia mais os campos por onde andava. Definitivamente encontrara a eternidade, mas nunca saí do capítulo 1. Pois agora, refletindo durante longos anos (pelo menos é o que me parece) sobre outros tantos anos (já me perco em relação ao tempo, essa variável insignificante) vejo que nunca houve, da parte alheia, evolução. Nunca houve motivação. Nunca houve desenvolvimento. Nunca houve, então, história.
E eu criei a minha. Do meu elevado posto, desci à mais profunda lama, provei do mais amargo fel, senti a mais negra maldição descer sobre mim, e, mesmo assim, alcançei a glória de um fim digno. Alcançei a eternidade, a glória sozinho. Tropeçando no meu egoísmo.
Agora que os dois fatos foram narrados - podemos chamá-los de anti-história e a  história, que se formou a partir da indigna primeira - segue-se a nota de rodapé - na última ou na primeira página, não sei dizer: Eis que pagará por todo o egoísmo. E, quando percebi que não havia um fim nessa anti-história, uma vez que nunca existiu, eis que alcanço o fim de minha história criada.
E, então, queimo.
Queimo meu egoísmo.
Mas eis que, como já foi dito anteriormente, a profecia errara. (Nota: Reclamar com o editor que colocou uma nota de rodapé falsa)
Por que, enquanto queimava, só enquanto as chamas possuíam cada centímetro do meu corpo, foi que percebi que nem todas as pessoas são como as que conheci. Nem todos partilham da podridão que me foi apresentada. Que nem todas partilham da mesma anti-história. Que há pessoas pelas quais vale a pena continuar a narrar, continuar a escrever, continuar a viver sua história. 
Pois termino do modo como começei, salvo um pequeno detalhe: Não estou sozinho. Estou livre.
Que a história começe.

[Fernando M. Minighiti][08.12.2011][23:05]


sábado, 3 de dezembro de 2011

Laços

Você esnoba
Tudo o que um dia já fomos
Você não se importa
Com o futuro que está morrendo
Eu não volto
Para casa por que eu sei que vou
Encontrar o que costumávamos ser
Aos pedaços.

Estaremos juntos juntos de novo
O fim é sempre como o início.
Estaremos mais uma vez unidos
Na precisão desse gatilho?

Laços criados,
Dos nossos segredos e medos
E sorrisos, e abraços
Até o sangue nas veias impuras
Que devem ser derramados
E unificados.

Eu me forço
A aceitar a mudança
Como uma velha amiga
Mesmo sabendo
Que nada e ninguém
Lhe roubará o seu trono
Então eu volto
Em memórias do passado
Em promessas de futuro
E me ponho a recolher
Os pedaços.

Estaremos juntos juntos de novo
O fim é sempre como o início.

Estaremos mais uma vez unidos
Na precisão desse gatilho?

[Fernando M. Minighiti][03.12.2011][23:53]

 
 
"All my nightmares escaped my head
Bar the door, please don't let them in
You were never supposed to leave
Now my head's splitting at the seams
And I don't know if I can
Here, beneath my lungs, I feel your thumbs press into my skin again"

[Welcome Home. Radical Face]